Política
Anistia seria preocupante e mau exemplo, dizem juristas

Convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores, uma manifestação marcada para este domingo (16), no Rio de Janeiro, defenderá a anistia aos réus processados por atos antidemocráticos em Brasília, em 8 de janeiro de 2023. O protesto busca impulsionar a tramitação de projetos de lei no Congresso Nacional que propõem a extinção da punição aos envolvidos nas invasões e depredações às sedes dos três poderes há dois anos.
Juristas ouvidos pela Agência Brasil consideram que anistiar crimes contra a democracia é preocupante. Para Gustavo Sampaio, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF), a anistia seria um mau exemplo para o país.
“Com democracia não se brinca. Se houve crimes contra a democracia, e todas as provas demonstram cabalmente que esses crimes aconteceram, não é razoável a esses criminosos que lhes seja dado o perdão da anistia. Isso será o mesmo que conceder um mau exemplo ao Brasil, um mau exemplo a essas pessoas de que poderão se articular novamente contra o Estado Democrático de Direito, acreditando que receberão o perdão”.
Além disso, de acordo com o professor a proposta de anistia não vem em um bom momento. “Essas pessoas, que são autoras de crimes contra o Estado Democrático de Direito, precisam receber severas sanções para que assim fique o bom exemplo e que ninguém se articule novamente para obrar contra a democracia brasileira”, explica o professor.
Segundo ele, a democracia “é valor maior, é cláusula pétrea do sistema constitucional, é princípio da ordem institucional do Estado brasileiro e com isso não se pode, evidentemente, transigir. É um valor que devemos defender, de maneira que o projeto de lei de anistia não vem num bom momento e não dá um bom sinal político para a democracia brasileira”.
A professora de Direito Penal da Fundação Getulio Vargas em São Paulo (FGV) Raquel Scalcon afirma que é difícil sustentar a legitimidade de uma anistia a pessoas que atentaram contra o Estado Democrático de Direito.
“No fundo, estamos falando de crimes que querem, pelo menos em tese, implodir o próprio sistema democrático, o sistema constitucional. Eu não acho que nunca nada possa ser anistiado, só me preocupa o fato de que nós estamos tratando de discussões que envolvem crimes contra o Estado Democrático de Direito”.
Golpe na democracia
Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Vitor Schirato, a anistia representaria um golpe na democracia brasileira. “É um enfraquecimento enorme da democracia brasileira. É mais uma fragilização na democracia brasileira, sem dúvida nenhuma”, destaca.
Segundo ele, “é absolutamente despropositado imaginar um parlamentar democraticamente eleito, que exerce a sua função por causa do Estado Democrático de Direito, possa anistiar quem tentou acabar com o Estado Democrático de Direito”.
Em nota divulgada em fevereiro deste ano, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) afirmou que “a anistia aos golpistas é um desrespeito à memória de todos aqueles que lutaram pela democracia em nosso país e foram mortos. É fundamental que todos se unam, exigindo que nossos representantes ajam com responsabilidade na proteção dos valores democráticos”, diz a nota. “Não admitiremos anistia! Nosso país precisa caminhar com Memória, Verdade e, sobretudo, Justiça!”.
O 8 de janeiro
Uma semana após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 1º de janeiro de 2023, manifestantes que estavam acampados em frente ao Quartel General do Exército Brasileiro, em Brasília, se reuniram com militantes de outros locais na Esplanada dos Ministérios e avançaram, sem ser impedidos pela Polícia Militar do Distrito Federal, contra os prédios da Praça dos Três Poderes, invadindo as sedes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.
Criminosos promoveram atos de vandalismo que destruíram mobiliário, obras de arte e objetos históricos, além de gabinetes, vidraças, equipamentos eletrônicos e outros bens que encontraram pelo caminho.
A destruição foi transmitida ao vivo pela imprensa e causou choque e indignação em autoridades e na sociedade civil. Mais de 1,4 mil pessoas foram presas, e o Ministério Público Federal ofereceu denúncias contra 1,7 mil envolvidos nos ataques.
Até dezembro de 2024, 370 pessoas já haviam sido condenadas pelos crimes relacionados ao ataque, entre eles golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e dano qualificado. Além disso, mais de 500 pessoas haviam assinado acordos na Justiça. No último dia 7, mais 63 pessoas foram condenadas a penas que chegam a 14 anos de prisão
A Polícia Federal e a Procuradoria Geral da República afirmam que o atentado fez parte de uma tentativa de golpe de Estado articulada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados, que foram indiciados e denunciados à Justiça.
Segundo o relatório da PF e a denúncia da PGR, o episódio se insere em uma cronologia que incluiu a deslegitimação das urnas eletrônicas, os acampamentos em frente a quartéis para mobilizar as Forças Armadas, ataques nas redes sociais a comandantes que não apoiassem o golpe e até mesmo planos para assassinar o presidente da república, o vice e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Quando a denúncia foi revelada, o advogado de defesa de Jair Bolsonaro, Paulo Cunha Bueno, divulgou nota na qual afirma que o ex-presidente “jamais compactuou com qualquer movimento que visasse a desconstrução do Estado Democrático de Direito ou as instituições que o pavimentam”. Segundo ele, nenhum elemento que conectasse minimamente o presidente à narrativa construída na denúncia foi encontrado. “Não há qualquer mensagem do então presidente da República que embase a acusação”.
Projetos de lei
Os projetos de anistia que tramitam na Câmara dos Deputados foram unidos ao Projeto de lei 2.858/2022, de autoria de major Vitor Hugo (PL-GO), que anistia os processados por crimes relacionados a manifestações contra o resultado da eleição presidencial de 2022, ocorridas a partir do segundo turno do pleito, em 30 de outubro daquele ano, o que inclui os atos de 8 de janeiro do ano seguinte.
No Senado Federal, tramitam outros projetos, como o PL 5.064/2023, de autoria de Hamilton Mourão (Republicanos/RS), que anistia os envolvidos nos atos de 8 de janeiro das condenações pelos crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Outro, de autoria de Márcio Bittar (União/AC), além de anistiar todos os crimes, restaura os direitos políticos de cidadãos declarados inelegíveis por atos relacionados às eleições de 2022.
Os defensores da anistia alegam que há perseguição política aos réus e denunciados por golpe de Estado. Autor do projeto de lei que tramita na Câmara, o ex-deputado federal e hoje vereador em Goiânia, major Vitor Hugo escreveu em suas redes sociais, na semana passada, que “cidadãos honestos” estão sendo tratados como “inimigos da democracia só porque pensam diferente”.
O senador Márcio Bittar divulgou em suas redes sociais também na semana passada, vídeo em que diz que “brasileiros condenados injustamente precisam da nossa ajuda”.
Já o senador Hamilton Mourão afirmou que seu projeto de lei de anistia foi pensado para “barrar a injustiça decorrente das condenações desproporcionais de homens e mulheres detidos em decorrência dos atos de 8 de janeiro” e que a anistia não representa impunidade, mas a luta contra penalidades desproporcionais aplicadas”.
Constitucionalidade
Os juristas ouvidos pela Agência Brasil explicaram que a Constituição Federal dá poder ao Congresso Nacional de conceder anistia a pessoas condenadas no Brasil. No entanto, há controvérsias, no meio jurídico, sobre se seria possível anistiar pessoas envolvidas em crimes contra o Estado Democrático de Direito.
“A anistia se caracteriza como um perdão concedido pelo legislador, que é diferente do perdão concedido pelo Poder Executivo no indulto. O perdão concedido pelo legislador é muito mais amplo, é concedido por lei e extingue o crime, porque quem tem autoridade para legislar é o Congresso Nacional”, explica Gustavo Sampaio.
Segundo ele, no entanto, o poder de anistiar crimes não é ilimitado. Há, segundo Sampaio, uma divisão de entendimento no meio jurídico em relação à anistia a crimes contra a democracia.
Entre os que defendem a possibilidade de anistia, a justificativa é que a Constituição Federal diz apenas que a ação de grupo armado contra a ordem constitucional e o Estado Democrático é “crime inafiançável e imprescritível”, mas não define, de forma explícita, que seja insuscetível a anistia.
Entre aqueles que consideram a impossibilidade da anistia estão juristas que consideram que a Constituição impõe uma “limitação implícita” e que anistiar um crime contra a democracia é incoerente.
“O Congresso Nacional, a quem é dado o poder de conceder a anistia, é a casa de representação do povo. Ele é eleito pelo povo. Eleito pelo povo porque temos uma democracia em que o povo pode eleger os seus representantes. Então, essa parte da doutrina diz que seria contraditório que o Congresso Nacional pudesse conceder a anistia aos detratores da democracia, se o próprio Congresso Nacional existe em razão da democracia”.
Segundo Raquel Scalcon, anistia é a extinção de punibilidade de um crime. “O Estado deixa de ter o poder de punir alguém por um fato criminoso, ou seja, de punir um grupo mais ou menos identificável de pessoas. A Constituição dá o poder de criar uma lei de anistia para o Poder Legislativo. E tirando alguns crimes que a própria Constituição fala expressamente que não podem sofrer anistia, a Constituição não traz grandes critérios sobre o que pode ser abarcado por uma anistia”.
STF
A jurista explica que, caso os projetos de lei sejam aprovados pelo Congresso Nacional, seguramente serão submetidos à apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF).
“Acho impossível que não haja, como ato subsequente, uma nova queda de braço no âmbito do Supremo, alegando-se [por pessoas contrárias à anistia] que há uma inconstitucionalidade ali. Será que esses crimes são efetivamente passíveis de anistia? Acho que essa seria uma pergunta central que o Supremo teria que responder”.
Ela acredita que, no caso de a anistia chegar ao STF, a corte tenderia a considerar que certos crimes não podem ser anistiados, especialmente se tratando de crimes contra o Estado Democrático. “A jurisprudência tem sido cada vez mais exigente, diminuindo a discricionaridade dos poderes de anistiar ou de indultar. Acho que a tendência seria o Supremo entender como inconstitucional”.
Gustavo Sampaio também acredita que a questão será certamente definida pelo STF. “Como tem acontecido com muitas leis no Brasil, decerto que, se o Congresso aprovar um projeto de lei nesse sentido, essa futura lei será levada ao Supremo Tribunal Federal, que examinará se o Congresso Nacional teria ou não poder para conceder aquele benefício de anistia”.
Em maio de 2023, o STF anulou, por oito votos a dois, um indulto concedido, em 2022, ao ex-deputado Daniel Silveira, pelo então presidente da República, Jair Bolsonaro, seu aliado, por considerá-lo inconstitucional.
Em seu voto, o ministro do Supremo Dias Toffoli considerou que atos atentatórios à democracia não poderiam ser objeto de indulto [extinção de punibilidade concedida pelo Poder Executivo, em vez do Legislativo].
Toffoli considerou que os crimes cometidos por Silveira, condenado pela Corte a oito anos e nove meses por ameaça ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo, foram um embrião dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
Já a ministra Carmen Lúcia ressaltou que o indulto não poderia ser instrumento de impunidade nem uma mensagem para que as pessoas possam continuar a praticar crimes contra a democracia.
“Nenhuma capacidade jurídica é ilimitada. Não existe nada que seja ilimitado. É óbvio que o Congresso Nacional tem a competência de conceder anistia, mas é uma competência limitada. O Congresso não pode conceder anistia em qualquer caso, do jeito que ele queira. Não é coerente utilizar um mecanismo do Estado Democrático de Direito para perdoar quem atentou contra o Estado Democrático de Direito”, afirma Schirato.
Aplicação
Os juristas ouvidos pela Agência Brasil consideram que, se a anistia for concedida pelo Congresso, ela beneficiará não apenas aqueles que participaram ativamente dos atos de 8 de janeiro, como aqueles que foram denunciados como organizadores de uma tentativa de golpe de Estado no país, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Gustavo Sampaio destaca, no entanto, que será preciso discutir, por exemplo, se uma lei de anistia poderá ser aplicada a pessoas que ainda não tiveram sentença condenatória, como é o caso de Bolsonaro e dos denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em fevereiro deste ano.
“A ação penal em relação aos invasores da Praça dos Três Poderes já existe, e muitos já foram até condenados. Mas, em relação à estrutura hierárquica superior do governo, a ação penal vai haver agora, se for recebida a denúncia e instaurada a ação na primeira turma do Supremo Tribunal Federal. Ora, se nem há ação penal, não há condenação, se não há condenação, não há crime. Como é que o Congresso já pode anistiar?”, argumenta o jurista.
Raquel Scalcon afirma que, caso a anistia seja aprovada no Congresso, além do julgamento em relação à inconstitucionalidade da lei, o STF ainda terá que definir se a anistia se aplica a cada ação específica.
“É preciso analisar, caso a caso, porque a lei não vai ser específica para fulano. Ela será uma lei geral. Quem analisa se aquele caso está abarcado ou não pela lei de anistia é o próprio Poder Judiciário. É o Judiciário que vai declarar extinta a punibilidade. Não tem como o Congresso Nacional parar todos os processos que envolvem esse tema. Essa análise precisará ser feita pelo Judiciário”, explica a jurista.
Política
Lula diz que Brics seguirá discutindo alternativas ao dólar

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, na noite desta quinta-feira (10), que o Brics, fórum que reúne grandes países do chamado Sul Global, seguirá discutindo mecanismos mais autônomos para impulsionar as relações comerciais. As declarações de Lula, concedidas em duas entrevistas a canais de televisão, ocorre em meio à escalada de tensões com os Estados Unidos, desde que o presidente Donald Trump anunciou tarifa comercial de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados.
“O Brics é um fórum que ocupa metade da população mundial e quase 30% do PIB mundial. E 10 países do Brics participam do G20 [incluindo o Brasil], onde o senhor Trump participa [pelos EUA]”, destacou o presidente em entrevista exibida pelo Jornal Nacional, da TV Globo.
“Nós cansamos de ser subordinados ao Norte. Queremos ter independência nas nossas políticas, queremos fazer comércio mais livre e as coisas estão acontecendo de forma maravilhosa. Nós estamos discutindo, inclusive, a possibilidade de ter uma moeda própria, ou quem sabe com as moedas de cada país a gente fazer comércio sem precisar usar o dólar”, acrescentou Lula.
Discussão civilizada
Em outra entrevista, exibida pelo Jornal da Record, da Record TV, Lula também reforçou que a ação de Trump contra o Brasil mostra a insatisfação dele com o protagonismo mundial do Brics.
“Eu não sou obrigado a comprar dólar para fazer relação comercial com a Venezuela, com a Bolívia, com o Chile, com a Suécia, com a União Europeia, com a China. A gente pode fazer nas nossas moedas. Por que eu sou obrigado a ficar lastreado pelo dólar, que eu não controlo? Quem tem uma máquina de produzir dólar são os EUA, não nós”, criticou.
O presidente enfatizou que qualquer discordância deveria ser discutida em uma mesa de negociação, e não com ataques comerciais e à soberania dos países.
“Se ele [Trump] tivesse divergência, o correto seria numa reunião do G20 ele levantar o problema, vamos fazer uma discussão civilizada, nos convença, vamos discutir. O que ele não pode é agir como se fosse dono dos outros”.
Ao Jornal Nacional, Lula explicou que, no momento, não pretende ligar para Trump, mas que vai sair em defesa do setor produtivo brasileiro com a abertura de novos mercados. O presidente observou que o tom de abordagem do norte-americano é desrespeitoso e que não aceitará esse tipo de comportamento.
“Ele, por exemplo, poderia ter ligado para o Brasil para dizer a medida que ele vai tomar. Ele não mandou nenhuma carta, nós não recebemos carta. Ele publicou no site dele, numa total falta de respeito, que é um comportamento dele com todo mundo. E eu não sou obrigado a aceitar esse comportamento desrespeitoso entre relações de chefe de Estado, de relações humanas”.
Manutenção do IOF
Ainda na entrevista para a TV Record, Lula anunciou que vai insistir no aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Segundo o presidente, se o governo tiver de cortar R$ 10 bilhões em despesas, como está sendo projetado, o corte também vai afetar as emendas parlamentares.
“O deputado sabe que, se eu tiver que cortar R$ 10 bilhões, eu vou cortar das emendas dele também. Como eles sabem e eu sei, é importante a gente chegar num ponto de acordo. Eu posso antecipar para você: eu vou manter o IOF. Se tiver um item no IOF que esteja errado, a gente tira aquele item, mas o IOF vai continuar”, declarou o presidente.
“Fazer decreto é responsabilidade do presidente da República. E os parlamentares podem fazer um decreto-lei para eles, se tiver cometido algum erro constitucional, coisa que não cometi”, completou.
Na semana passada, após uma derrota histórica do governo no Legislativo, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, suspendeu tanto os decretos do Executivo que elevam o IOF quanto o decreto que foi aprovado pelo Congresso Nacional e que derruba essa medida. Para resolver o impasse, Moraes determinou a realização de uma audiência de conciliação entre o governo federal e o Congresso Nacional sobre o tema para o próximo dia 15 de julho, em Brasília.
Política
Em jornais estrangeiros, Lula defende diplomacia e multilateralismo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a diplomacia, a cooperação e o multilateralismo como ferramentas para enfrentar os desafios do mundo atual. Em artigo publicado nesta quinta-feira (10) em veículos da imprensa de diversos países, o presidente disse que a prevalência da “lei do mais forte” ameaça o sistema de comércio multilateral.
Sem citar diretamente as ações do presidente estadunidense, Donald Trump, que anunciou ontem a taxação de 50% nas exportações de todos os produtos brasileiros para os Estados Unidos, Lula disse que a adoção de tarifas abrangentes empurra a economia global para uma “espiral de preços altos e estagnação”.
“A Organização Mundial do Comércio foi esvaziada, e ninguém se lembra da rodada de desenvolvimento de Doha”, observou.
O presidente defendeu novamente a reorganização dos organismos multilaterais como solução para os conflitos.
“Se as organizações internacionais parecem ineficazes, é porque sua estrutura não reflete mais a realidade atual. As ações unilaterais e excludentes são agravadas pela ausência de liderança coletiva. A solução para a crise do multilateralismo não é abandoná-lo, mas reconstruí-lo em bases mais justas e inclusivas”, escreveu o presidente.
O artigo foi publicado em jornais como o inglês The Guardian, o argentino Clarín e o chinês China Daily.
Papel da ONU
Segundo Lula, o ano de 2025 deveria ser de celebração em razão das oito décadas de existência da Organização das Nações Unidas (ONU), mas corre o risco de entrar para a história como o ano em que a ordem internacional construída desde 1945 entrou em colapso.
Lula disse que o mundo de hoje é diferente do que emergiu após a segunda guerra mundial e que novas forças políticas e econômicas surgiram, colocando novos desafios. No artigo, Lula destaca que as “rachaduras” que vem desafiando o papel da organização em mediar conflitos e disputas já estavam visíveis há algum tempo.
“Desde as invasões do Iraque e do Afeganistão, a intervenção na Líbia e a guerra na Ucrânia, alguns membros permanentes do Conselho de Segurança banalizaram o uso ilegal da força. A incapacidade de agir em relação ao genocídio em Gaza representa uma negação dos valores mais básicos da humanidade. A incapacidade de superar as diferenças está alimentando uma nova escalada de violência no Oriente Médio, cujo último capítulo inclui o ataque ao Irã”, destacou.
Lula disse ainda que a crise financeira mundial de 2008 expôs o fracasso da globalização neoliberal, mas que o mundo, em vez de apontar para outra direção, “continuou preso ao manual de austeridade”.
“A escolha de socorrer os ultra-ricos e as grandes corporações às custas dos cidadãos comuns e das pequenas empresas aprofundou a desigualdade”, disse.
Para o presidente, o estrangulamento da capacidade de ação do Estado levou à desconfiança do público nas instituições. Esse descontentamento se tornou um terreno fértil para narrativas “extremistas que ameaçam a democracia e promovem o ódio como um projeto político.”
Lula disse ainda que, em vez de redobrar os esforços para reduzir as desigualdades, com a implementação dos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU até 2030, muitos países cortaram programas de cooperação internacional
“Não se trata de caridade, mas de abordar as disparidades enraizadas em séculos de exploração, interferência e violência contra os povos da América Latina e do Caribe, da África e da Ásia. Em um mundo com um PIB combinado de mais de US$ 100 trilhões, é inaceitável que mais de 700 milhões de pessoas ainda passem fome e vivam sem eletricidade ou água”, destacou.
Crise climática
O presidente defendeu a maior responsabilidade dos países mais ricos diante do aumento da crise climática, já que são os principais emissores de carbono na atmosfera.
“O ano de 2024 foi o mais quente da história, mostrando que a realidade está se movendo mais rapidamente do que o Acordo de Paris. As obrigações obrigatórias do protocolo de Kyoto foram substituídas por compromissos voluntários, e as promessas de financiamento feitas na COP 15 em Copenhague em 2009 – prometendo US$ 100 bilhões anuais – nunca se concretizaram. O recente aumento nos gastos militares da OTAN [Organização Militar do Atlântico Norte] torna essa possibilidade ainda mais remota”, avaliou.
Lula disse ainda que os ataques às instituições internacionais ignoram os benefícios concretos que o sistema multilateral trouxe para a vida das pessoas e citou como exemplo a erradicação de doenças como a varíola, as ações para preservar a camada de ozônio e o debate sobre a proteção dos direitos trabalhistas.
“Em tempos de crescente polarização, termos como ‘desglobalização’ se tornaram comuns. Mas é impossível ‘desplanetar’ nossa existência compartilhada. Nenhum muro é alto o suficiente para preservar ilhas de paz e prosperidade cercadas de violência e miséria”, disse.
“Esse é o entendimento que o Brasil – cuja vocação sempre foi fomentar a colaboração entre as nações – demonstrou durante sua presidência do G20 no ano passado e continua demonstrando em suas presidências do Brics e da Cop 30 neste ano: que é possível encontrar pontos em comum mesmo em cenários adversos”, finalizou Lula.
Política
Lula crítica jornada 6×1 e defende escala de trabalho “mais flexível”

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou, nesta sexta-feira (11), a jornada de trabalho de seis dias de serviço com apenas um dia de folga por semana (6×1). Para Lula, é preciso convocar trabalhadores e empresários para “inventar” outra jornada de trabalho “mais flexível”.
“A Humanidade não quer mais seis por um. É preciso inventar um jeito de ter uma outra jornada de trabalho, mais flexível, porque as pessoas querem ficar mais em casa. As pessoas querem cuidar mais da família”, disse Lula.
A primeira vez que o presidente se manifestou sobre o tema publicamente foi no dia do trabalhador deste ano, em 1º de maio, quando defendeu “aprofundar o debate” sobre a escala 6×1.
Ao lançar, em Linhares (ES), programa de transferência de renda para atingidos por rompimento da barragem em Mariana (MG) nesta sexta-feira (11), Lula disse que o trabalhador não aguenta mais acordar cinco da manhã e voltar as sete da noite durante seis dias por semana.
“Hoje a juventude já não quer mais isso. É importante que a gente, enquanto governo, trate de pesquisar. Vamos utilizar a universidade, a OIT [Organização Internacional do Trabalho], vamos utilizar tudo que é organização de trabalho e vamos tentar apresentar uma nova forma de trabalhar nesse país. Para que a gente possa garantir mais mobilidade para as pessoas”, completou Lula.
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Pressão social
A pauta do fim da escala 6×1 ganhou força no Brasil no final do ano passado e manifestações de rua nessa quinta-feira (10) voltaram a pedir o fim desse tipo de escala de trabalho.
No Congresso Nacional, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com a jornada 6×1 não teve avanço. Lideranças do governo dizem que a medida é “prioridade” para este ano.
O projeto sofre resistência de setores empresariais que alegam que a medida levaria ao aumento dos custos operacionais das empresas, como defendeu a entidade patronal Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
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